– Chega para você paciente 73 anos, previamente diabético, apresentando quadro de dor torácica iniciada há 1 dia de forma intermitente, e que se tornou constante há 2 horas.
– Realizado ECG na triagem: supra de ST em DII, DIII e aVF
– Paciente recebe AAS 300mg VO para mastigar e clopidogrel 300mg VO
Você solicita novo eletrocardiograma para realização das derivações direitas e posteriores. Enquanto os eletrodos são posicionados, paciente evoluiu com perda da consciência e movimentos estereotipados como uma convulsão generalizada. O que aconteceu?
Rapidamente você tenta checar pulso, mas sem perder mais tempo, inicia massagem cardíaca já imaginando o que esperar: Fibrilação Ventricular! 🤨
—> Convulsões e perda da consciência secundárias à arritmias cardíacas se forem interpretadas como epilepsia podem causar prejuízos catastróficos, não só por uso desnecessário de anticonvulsionantes como retardo do reconhecimento e tratamento de condições ameaçadoras a vida. (1)
A síncope cardíaca é causada pela redução global da perfusão cerebral devido a súbita redução do débito cardíaco! Arritmias e doença cardíaca estrutural como a estenose aórtica e cardiomiopatia são as causas mais importantes de síncope cardiogênicas. (1,3)
🚨🚨 O tratamento para a convulsão não-epileptogênica secundária à Fibrilação Ventricular é desfibrilação miocárdica imediata! Ou seja o restabelecimento rápido do fluxo cerebral!🚨🚨
Arritmias cardíacas acontecem em torno de 72 a 100% dos pacientes com IAM. As principais consequências das arritmias é alteração da performance hemodinâmica, comprometimento da viabilidade miocárdica por aumentar o consumo de O2 e risco de arritmias fatais. (2)
A incidência de arritmias é maior na SCA com elevação do segmento ST. (4)
Fisiopatologia das arritmias como complicação do IAM:
-> No IAM acontece uma disfunção autonômica generalizada que resulta em maior automaticidade do miocárdio e do sistema de condução. Assim como desequilíbrios hidroeletrolíticos (por exemplo, hipocalemia e hipomagnesemia) e hipóxia contribuem ainda mais para o desenvolvimento de arritmia cardíaca. O miocárdio danificado atua como substrato para circuitos reentrantes, devido a mudanças na refratariedade miocárdica.
Aumento da atividade simpática eferente, aumento das concentrações de catecolaminas circulantes e liberação local de catecolaminas por terminações nervosas no próprio músculo cardíaco têm sido implicado no desenvolvimento de arritmias peri-infarto. Além disso, o infarto transmural pode interromper os membros aferentes e eferentes do sistema nervoso simpático que inervam o miocárdio distal à área do infarto. O resultado desse desequilíbrio autonômico é a ocorrência de arritmias.
Enquanto realiza a massagem cardíaca você sabe que o paciente precisa receber choque elétrico IMEDIATAMENTE:
– Desfibrilador para checar ritmo já carregado em 200J
– Você posiciona as pás e confirma: FV
– Choque entregue
– Reassume RCP
– Iniciado oxigênio por BVM
– Acesso periférico
-Conpletado o ciclo
– Checa o ritmo: Sinusal com pulso
Iniciado cuidados pós-parada, paciente mantendo respiração espontânea, algo desorientado.
SINAIS: PA: 140x87mmHg, FC: 110 bpm, sat: 100% em MNRI 5l, FR: 18irpm
ECG: supra de ST DII, DIII e aVF
Seu serviço de hemodinâmica fica há aproximadamente 40minutos de distância, pela impossibilidade de transferência em tempo hábil você opta por trombólise química para o paciente.
Não apresenta contra-indicações, então vc prescreve:
– Tenectplase 9ml IV (paciente pesa 80kg)
Associado anticogaulaçao plena:
– Enoxaparina 30UI IV
– Enoxaparina 1mg/kg SC
Você inicia amiodarona em BIC, como cuidados pós parada de ritmo chocável.
(6amp + SG% 250ml: 20ml/h)
Aproximadamente 5 minutos após a realização do trombolítico paciente apresenta TV sustentada!!! 😱😱
Mas dessa vez foi tudo monitorizado!
Você prontamente realiza nova desfibrilação a 200J com retorno imediato para ritmo sinusal.
Paciente segue estável, aguardando transferência para centro com hemodinâmica, respirando espontaneamente, recupera a consciencia e se mantém tranquilo.
—> As arritmias de reperfusão se originam como consequência das complexas reações celulares e humorais que acompanham a abertura da coronária.
Supõe-se que na gênese da reperfusão, as arritmias, ao contrário das arritmias isquêmicas, operam mecanismos não reentrantes, como a automação anormal ou aumentada e a atividade desencadeada devido às pós-despolarizações.
Uma arritmia de reperfusão típica, é iniciada precocemente(dentro de 6 horas após o início da trombólise), é frequente (> 30 episódios / hora) e é repetitiva (ocorrendo durante> 3 horas consecutivas): Ritmo idioventricular Acelerado (RIVA).
RIVA: QRS largo, ausencia de onda P, FC menor que 100bpm (Ele é ventricular como uma taquicardia ventricular (o que justifica o uso dos Critérios de Brugada), porém com frequência abaixo de 100bpm.) (6)
RIVA com tais características tem alta especificidade e precisão preditiva positiva, mas baixa sensibilidade relativa como preditor de reperfusão. Assim, na ocorrência de RIVA, a recanalização da artéria coronária relacionada ao infarto é muito provável, mas na ausência de RIVA, a reperfusão ainda não está excluída.
As seguintes arritmias são consideradas também como marcadores de reperfusão: extras sístoles ventriculares freqüentes (aumento de duas vezes na freqüência dentro de 90 minutos após o início da trombólise), aumento significativo de episódios de taquicardia ventricular não sustentada, bradicardia sinusal e provavelmente também bloqueio atrioventricular de alto grau.
No momento, não há evidências definitivas, se a taquicardia ventricular sustentada e especialmente a fibrilação ventricular podem ser causadas pela reperfusão.
As arritmias de reperfusão são um importante marcador não invasivo de recanalização bem sucedida da coronária relacionada ao infarto.
No entanto, eles também são um sinal de lesão de reperfusão e um achado que pode limitar o efeito favorável da reperfusão. (5)
Bibliografia:
(1) Dello, S. A. W. G., et al. Loss of consciousness and convulsion induced by a ventricular tachycardia mimicking epilepsy in a patient with noncompaction cardiomyopathy: a case report, Neth Heart J. 2014 Jun; 22(6): 301–303. Published online 2013 Jul 5. doi: [10.1007/s12471-013-0442-7]
(2) Book: Tintinallis Emergency Medicine, A comprehensive Study Guide, 8th edition, Chapter 49 Acute Coronary Syndromes,
(3) Nonepileptic seizure provoked by cardiac dysrhythmia with STEMI, Pourmand A., MD, MPH ⁎, Davis S., MD, Yensen K., BS, American Journal of Emergency Medicine 36 (2018) 169.e1–169.e3, https://doi.org/10.1016/j.ajem.2017.10.013
(4) Blog: Complications of Myocardial Infarction, Author: Ashok K Kondur, MD; Chief Editor: Eric H Yang, MD, Medscape: https://emedicine.medscape.com/article/164924-overview#a2
(5) Artigo: Reperfusion arrhythmias, Review, Jurkovicová O, et al. Bratisl Lek Listy. 1998 Mar-Apr, PMID 9919746
(6) Blog: Qual a Alteração Mostrada no ECG?, Pedro Veronese, Cardiopapers, https://cardiopapers.com.br/qual-a-alteracao-mostrada-no-e…/