Casos em ME 002: Via Aérea Fisiologicamente Difícil – Caso 01

Prometa mergulhar nas referências e nós prometemos nos manter diretos! 
O foco dessa série é mostrar um exemplo prático e direto de como usamos a literatura na nossa prática. Mergulhe fundo você também!

Chega pra você uma paciente de 56 anos, previamente HAS e tabagista, com diagnóstico de AVCi há 2 semanas, e agora com quadro de dispneia há 2 dias e febre há 1 dia. 
SSVV: PA: 80x56mmHg FC: 135bpm FR: 32irpm Sat 88% em AA Tax 38.3C Glicemia: 110mg/Dl

A: vias aéreas pérvias, responsiva a dor
B: taquidspneia, MV com creptos em base D, acianótica
C: 2bnfr sem sopro, TEC> 3 seg

Você solicita início de oxigenioterapia com MNR 10l/min, acesso venoso periférico, coleta de sangue para exames laboratoriais na mesma punção, inicia hidratação com Ringer Lactato 500ml EV agora

História secundária (com a família e prontuário médico):
Paciente estava em casa há 3 dias, pós alta hospitalar. Apresentava sequela motora em hemicorpo direito, vígil, parcialmente dependente, se alimentando por via oral com pouca ajuda. Começou apresentar um “cansaço” há dois dias, e tosse esporádica, evoluindo com piora de engasgos frequentes ao se alimentar. Hoje a paciente se manteve muito sonolenta e apresentava febre. 
Em uso de losartana, HCTZ, anlodipino, AAS, clopidogrel e sinvastatina. 
Nega alergias. Nega cirurgias prévias. Mora com seu marido uma filha. Ficou acamada, parcialmente dependente. 
Diretiva de vida: Familiar não sabe à respeito. 

No exame físico secundário 
Aparenta sonolência e letargia
ECGl:10 (AO 2 RV 3 RM 5), pupilas isocoricas fotorreagentes, deficit motor em hemicorpo D
AR: MV +, presença de creptos à D, taquipneia, uso de musculatura acessória (abdominal e intercostal)
ACV: 2bnfr sem sopros, hipotensa, TEC lentificado
Abdome: sem alt
MMII: sem edemas, sem sinais clínicos de TVP

Seu diagnóstico sindrômico é:
Choque + dessaturação + febre a/e 
Sua principal hipótese diagnóstica é: Sepse/choque séptico de foco pulmonar (pneumonia broncoaspirativa por germe hospitalar)

Você solicita gasometria arterial, culturas de sangue e urina, e posterior cultura de secreção orotraqueal e demais exames laboratoriais (hemograma completo, eletrólitos, função renal e hepática, TAP e TTPA). Após coleta das culturas, você inicia antibiótico Tazocin 4,5g EV em bólus.
Na reavaliação dos SSVV:
PA: 85x55mmHg, FC: 101bpm, FR 30irpm, Sat 95% com CN 5l/min
GasA: pH 7.05 pCO2: 20 pO2: 62 HCO3: 15 Lactato 2.0 Na 135 K 3.5 Cl 108 Ca 1.1
Você solicita mais 500ml de RL EV agora
Você realiza o POCUS na tentativa de mais informações sobre o estado volêmico da paciente e uma avaliação qualitativa da função cardíaca, que você considera ambas normais.

Devido o quadro clínico da paciente de gravidade e risco de piora com deterioração respiratória você opta por intubação orotraqueal.

Qual técnica seria a mais apropriada para essa paciente?
Essa via aérea tem complexidades/dificuldades? Como diminuir os riscos para o paciente?
Quais medicações seriam as melhores escolhas?

Após indicar a intubação, confirmar com a equipe e familiares, enquanto todo material é preparado, você avalia se a paciente tem preditores anatômicos para via aérea difícil. Da mesma forma, também é necessário avaliar os preditores para via aérea fisiologicamente difícil. 

Via Aérea Fisiologicamente Difícil

A Via Aérea Fisiologicamente Difícil(VAFD) é quando o paciente está em uma condição fisiológica que pode ser deteriorada por causa da intubação, apesar da necessidade de proteção das vias aéreas e ou Ventilação por Pressão Positiva (VPP).(1–6) Ou seja, quando essas alterações pioram os desfechos para o paciente. É importante ter em mente que o procedimento de obtenção de uma via aérea avançada por natureza causa alterações fisiológicas no paciente devido:

Apnéia: Aumento de CO2 e consumo de O2
Indutores: Medicações que podem causar hipotensão e depressão miocárdica
Ventilação por Pressão Positiva: Aumento de Pressão Intratorácica com risco de colapso hemodinâmico e parada cardíaca(PCR), pacientes com disfunção/insuficiência de VD apresentam risco de PCR

E que essas alterações, apesar de serem bem toleradas num paciente estável, podem ser muito deletérias conforme mais crítico o estado do paciente.

Preditores de via aérea fisiologicamente difícil:

Você deve procurar por esses sinais de risco em seu paciente, para poder planejar uma intubação mais segura e só realizar o procedimento após estabilização adequada conforme possível:

Hipotensão/Choque ou Índice de Choque(IC) aumentado
Disfunção/Insuficiência de VD 
Hipoxemia (aumento do Distúrbio V/Q e shunt)
Aumento do consumo de Oxigênio
Acidose grave (pH < 7,2)

Ao avaliar sua paciente você percebe que ela apresenta vários preditores de VAFD.
Na prática, nós realizamos essa avaliação e medidas de estabilização mais ou menos ao mesmo tempo. 

A primeira coisa a se perguntar é:

É possível realizar uma intubação acordado?

Na intubação com o paciente acordado evitamos a apneia e também doses altas de indutores, além de tentarmos uma adaptação mais paulatina a ventilação mecânica, e evitar uma piora do recrutamento alveolar durante a apneia. Ela é feita com topicalização com lidocaína da via aérea superior para amenizar os reflexos do paciente, podendo ser associado uma sedação leve conforme necessário. Essa modalidade de intubação ainda é rara no DE, estando presente em apenas 0.4% das intubações no DE dos EUA(7), classicamente é indicada apenas para via aérea anatomicamente difícil(VAD). Mais usada no Centro Cirúrgico pelos Anestesiologistas, em geral, com poucas complicações hemodinâmicas. (8–10) Portanto, é um procedimento seguro, que claramente deve fazer parte do arsenal de habilidades do Médico Emergencista e tem sido recomendado por especialistas como primeira opção não só na VAD, mas também na VAFD.(11–13) Concordamos com essa indicação e aguardamos por estudos futuros para avaliar sua real eficácia em diminuir desfechos ruins para nossos pacientes na emergência. 

Seu limitante é que necessitamos de um paciente colaborativo e profissional capacitado. Além de tempo para topicalização adequada da via aérea.

Apesar de ser possível realizar a Intubação no Paciente Acordado com laringoscopia direta(LD), consideramos que usar videolaringoscopia(VL) ou o endoscópio flexível torna o procedimento mais fácil e seguro.

No nosso caso, nossa paciente, não se apresenta colaborativa, o que dificultaria muito a topicalização da via aérea.
Então você opta por Sequência Rápida de Intubação.

Risco de dessaturar

Você inicia a PreOxigenação(preOx) com MNR flush rate (fluxômeto aberto até o “talo”), a saturação sobe para 98%.(11,13)

Porém, para além da preOx comum a todas as intubações na emergência, alguns pacientes precisam de medidas mais avançadas, pois sabidamente estão em risco de dessaturar de forma crítica (abaixo de 90%) mais rápido do que o tempo necessário para realização da laringoscopia e intubação, além do prejuízo ao recrutamento alveolar pela apnéia.(2–6) Como por exemplo, doenças que pioram o distúrbio V/Q (SDRA, COVID19, etc) ou situações que aumentem o consumo de oxigênio(sepse, gestação, criança, COVID19, agitação psicomotora, etc). 

Sabidamente tentamos evitar VPP, seja com uso da Bolsa-Válvula-Máscara(BVM) ou com Ventilação Não invasiva(VNI) no período pré-intubação, com intuito de evitar distensão gástrica e aumento do risco de broncoaspiração durante a apnéia e laringoscopia, porém nesses pacientes o risco está maior para o lado da dessaturação. Então cada paciente deve ter seu risco benefício de uma preOx com VPP determinado de forma individual.

Para essa decisão, avaliamos a doença atual, as comorbidades do paciente, e podemos associar resultados de exames de imagem (POCUS, Rx de toráx, TC), Gasometria Arterial(GasA) e saturação.

Caso não seja possível no mínimo uma saturação acima de 95% com sua escolha de preOx, é sugerido fortemente realizar preOx com VPP, por exemplo com VNI ou BVM com válvula de PEEP, com o objetivo de aumentar o recrutamento alveolar melhorando a Capacidade Residual Funcional e portanto a reserva de O2, além de desnitrogenação eficiente com oferta de Fio2 100%.

Outra forma de avaliar indicação de Intubação com Paciente Acordado é avaliar a troca gasosa a partir da GasA. Quando você consegue aumentar bem a pO2 com a sua escolha de preOx, isso te mostra que você está conseguindo garantir uma boa reserva de oxigênio e a troca pulmonar está adequada. Porém se mesmo com uma preOx otimizada, ou seja, mesmo com VPP (VNI), a pO2 continuar baixa, uma troca PaO2/Fio2(P/F) menor 100, esse é um indicador de que mesmo com desnitrogenação e reserva, o oxigênio não estará rapidamente disponível para a corrente sanguínea devido uma troca ruim, e portanto, com risco de em um curto período de apneia o paciente possa dessaturar criticamente e nesse caso a intubação com paciente acordado seria mais seguro.(13)

Em resumo: avalie a necessidade e possibilidade de Intubação Acordado, caso não seja possível, avalie a necessidade e possibilidade de preOx com VPP(VNI) (pesando risco de broncoaspiração x risco de dessaturar) e use Oxigenação apneica.

Oxigenação apneica

Toda intubação realizada no DE deveria utilizar Oxigenação Apneica, com vistas a manutenção da reserva de oxigênio durante o período de apneia e com isso diminuir o risco de dessaturação crítica durante a laringoscopia. Nos pacientes com piora do distúrbio V/Q e com consumo aumentado de O2, mais importante ainda tentar manter constante esse reservatório de oxigênio. Você pode usar como opções o cateter nasal 10 a 15l/min ou mesmo Cateter Nasal de Alto-fluxo(CNAF) se disponível, que consegue fazer um fluxo de até 60l/min. (11,13–18)

** Ressuscite ANTES de laringoscopar! **

Hipotensão/Choque

Está bem estabelecido que no paciente crítico a hipotensão, mesmo que transitória, pode ser deletéria, pois está associado com piores desfechos.

Em uma avaliação retrospectiva podemos ver diversos estudos associando a hipotensão antes, durante e logo após a intubação, de forma independente, com aumento de desfechos ruins para os pacientes, mais risco de PCR e óbito. Assim como o índice de choque > 0.8 também está relacionado com aumento do risco de parada cardíaca e óbito. (3,5,19–27)

Como mitigar essas complicações?

Reconhecer a hipotensão e pacientes com risco aumentado de evoluir com hipotensão (IC aumentado)
Investigar a causa da hipotensão
Iniciar o tratamento da causa da hipotensão/choque 
Monitorizar a PA e o IC com frequência, principalmente no pós intubação imediato. 

Avalie o estado volêmico. Iniciamos a ressuscitação do choque com cristaloides, 500 a 1000ml, porque estão rapidamente disponíveis, mas é importante avaliar se o paciente se apresenta realmente hipovolêmico, e se o coração suporta o aumento de volume. Para isso é necessário levar em conta, a doença, as comorbidades, o exame físico, e o uso do POCUS.(28) é importante salientar, porém, que o tratamento do choque deve ser direcionado para causa: desidratação, vasoplegia, hemorragia, choque cardiogênico etc.?

Para um restabelecimento rápido da perfusão, ao mesmo tempo em que estamos tratando a causa do choque, pode ser necessário iniciar DVA continua precocemente, como noradrenalina, principalmente quando a intubação precisa ser feita em um curto espaço de tempo. Já sabemos que essa prática é benéfica em pacientes críticos, e é seguro realizar DVA em acesso venoso periférico. O objetivo é conseguir uma PAM minimamente adequada, para evitar as complicações da alteração hemodinâmica causada pelos indutores e pela VPP.

Uma área especial é reservada ao paciente com Disfunção/Insuficiência Cardíaca de Ventrículo Direito (ICVD), mesmo que não esteja em choque, pois essa câmera cardíaca é ainda mais sensível às mudanças de pressão causadas pela intubação e Ventilação Mecânica, que podem levar a colapso cardíaco e hemodinâmico. Portanto, nesses casos, muitas vezes vai ser mais seguro evitar a intubação a todo custo e utilizar VNI com cuidado. O choque de VD deve ser tratado conforme orientações vigentes, baseado na causa, avaliando estado volêmico, iniciado DVA e associado inotrópico quando possível.(13) E também deve se considerar uma VM menos agressiva possível para limitar o aumento da pressão intratorácica: pressão de platô baixa, volume corrente baixo 6ml/kg, e PEEP baixa (5cmH2O).(12)

Em resumo: ao identificar um paciente hipotenso, restabeleça uma perfusão adequada antes de iniciar a intubação, tratando a causa do choque, e considere o início precoce de DVA. Considere intubação acordado. E naqueles pacientes normotensos, investigue riscos de descompensar (idoso, IC aumentado, etc) e deixe reservado uma Push-dose de vasopressor.

Push-dose de Vasopressor

A push-dose de vasopressor é uma dose em bólus (rápida) de um vasopressor, podendo ser adrenalina, fenilefrina ou noradrenalina, com intuito de resgatar de forma rápida um paciente com hipotensão severa em descompensação progressiva.(29,30) No contexto da intubação no DE, seria quando temos um paciente normotenso, que desenvolve hipotensão severa (PAM < 50mmHg) durante ou logo após o procedimento. É uma medida transitória e não um tratamento definitivo. Seu racional é a possibilidade de realizar um medicação de forma rápida, considerando a demora em se montar a Bomba de Infusão Continua(BIC) para uso de DVA continua.

Porém, mais uma vez, é importante salientar que a meia vida dessas medicações é curta, portanto, serve apenas para se ganhar tempo, enquanto o tratamento do choque e sua estabilização deve ser realizado imediatamente, com fluidos, hemoderivados e vasopressor contínuo conforme necessário. 

Outra observação importante é o cuidado que se deve ter ao preparar essas medicações, principalmente a adrenalina por ser um vasopressor potente e seus riscos de efeitos colaterais como taquicardia, hipertensão ou arritmias malignas. É preciso ter atenção à sua diluição e usar doses controladas com parcimônia. E lembrar que as apresentações de outros países podem ser diferentes.(31)

Recomendamos realizar a diluição de uma ampola de adrenalina 1 mg, para SF 100ml(10mcg/ml), e aspirar 10 a 20 ml em uma seringa. Assim fica mais fácil usar 0.5 a 2 ml por bolus, de 5 a 20mcg de adrenalina por dose.

Caso o paciente já esteja em uso de DVA continua não é necessário a preparação da push-dose, basta aumentar a vazão da DVA conforme necessidade.

Voltamos para nossa paciente, você já inicia noradrenalina 0.3mcg/kg/min para manter uma PAM > 65mmHg, enquanto mantem reavaliação constante do estado volêmico e da resposta à reposição de fluidos.

Escolha dos indutores

Sabemos que hipotensão, mesmo que transitória, em pacientes criticamente doentes, está associado com piores desfechos. E todas as medicações que usamos para realizar indução de SRI no DE tem potencial efeito deletério na hemodinâmica do paciente por atenuar o sistema simpático do paciente, alguns indutores mais que outros. (3,4,13,22,32–37)

Nesse contexto, nossa medicação de escolha para esses pacientes é o etomidato, que se mostrou mais hemodinamicamente estável, apesar de não haver superioridade em relação a cetamina para sobrevida em 30 dias.(12,38) A cetamina também é um excelente indutor, geralmente é cardioestável pois causa a liberação de catecolaminas endógenas, porém em pacientes muito graves, depletados de catecolamina, em dose “cheia” a cetamina pode precipitar depressão miocárdica e hipotensão, por isso, alguns especialistas sugerem redução da dose do indutor, de 25 a 50%.(3,6,12) Sugerimos atenção para uma dose que realmente leve a indução do paciente, para evitar a memória da paralisia muscular e da laringoscopia.(39)

Além disso sugerimos ainda evitar o propofol e principalmente o midazolan para indução desses pacientes, pois estão mais associados a hipotensão nos pacientes críticos.

Será que finalmente estamos prontos para intubação?

Você reavalia a GasA da sua paciente:

pH 7.05 PaCO2 20 PaO2 140 HCO3 12 Sat 99% Lactato 5 P/F 175 Na 142 Ca 1.1 Cl 110 K 5

A PaO2 melhorou com a preOx em VNI(mesmo a paciente estando um pouco rebaixada, por não haver distensão abdominal e vômitos, você considera que a melhora da preOx foi mais importante do que um aumento do risco de broncoaspirar – nesse caso). Agora o que te chama a atenção é a PaCO2 que está muito baixa, denotando uma tentativa intensa da paciente em compensar a acidose metabólica.

Acidose Grave

O que deve ser considerado principalmente nesse contexto é que na SRI o paciente em apneia, vai evoluir com aumento do CO2, e, portanto, interferência rápida no pH. Isso acontece em todo paciente, sem grandes complicações naqueles com estado metabólico normal, mas uma queda abrupta, em um paciente já com acidose grave pode precipitar arritmias cardíacas e colapso hemodinâmico. 

O ideal é evitar a intubação sempre que possível, considerando que muitas vezes é quase impossível reproduzir o volume minuto que o paciente consegue fazer fisiologicamente na VM. Junto com o tratamento da causa da acidose, você deve considerar estratégias para evitar uma apneia prolongada o máximo possível, sendo a intubação no paciente acordado o ideal, ou intubação somente com sedação: KOBI (Ketamine Only Breathing Intubation), que se diferencia da Intubação Acordado por não utilizar a topicalização da via aérea. (12,40,41) Ao não usar o Bloqueador NeuroMuscualar (BNM), você acaba abrindo mão da facilitação da laringoscopia pelo BNM em prol de se evitar apneia, pois tipicamente esses pacientes mantem drive respiratório.(40) Mais uma vez deve se pesar a avaliação individual, pois essas são medidas que carecem de mais dados na literatura para comprovação de eficácia e segurança.

Caso a técnica de escolha seja a SRI, considere manter VPP durante o período de apneia, assim você sustenta a manutenção de volume minuto durante esse período, na tentativa de evitar uma queda brusca do pH.(12)

A próxima medida é o ajuste da VM logo após a intubação, para que se adeque ao volume minuto do paciente antes da intubação (ou seja o mesmo volume minuto que ele estava usando para compensar o máximo possível a acidose). Um erro comum, é iniciar os parâmetros ventilatórios “normais” e portanto com volume minuto baixo, piorando o quadro instaurado durante a apneia. O volume minuto pode ser calculado de acordo com o necessário para manter a PaCO2 antes da intubação. A EtCO2 também pode ser usada para acompanhar a evolução da PaCO2(EtCO2 = PaCO2 – 2 a 4mmHg). É recomendado realizar uma nova gasometria arterial 15 minutos após a intubação para revisão dos parâmetros.

A reposição de bicabornato de sódio venoso de forma generalizada é controversa, não há consenso entre todos os especialistas, principalmente por falta de dados que confirmem segurança e eficácia dessa prática. Porém, em casos selecionados e graves pode ser uma medida a ser tentada, lembrando que o HCO3 vai se dissolver em CO2, portanto é muito necessário corrigir o volume minuto para clearance adequado do CO2. Se realizado, deve ser feito lento de 20 a 100mEq, 10 minutos antes da intubação.(12,27)

Você prescreve bicarbonato 100ml EV dez minutos antes de iniciar a intubação.
Avisa a fisioterapeuta sobre a necessidade de um volume minuto alto após a intubação e se prepara para um procedimento rápido, pensando em realizar a laringoscopia e passagem do tubo com mais rapidez, você decide usar bougie e videolaringoscopia.(42,43)

Reavaliação da Paciente:
SSVV: PA: 115x55mmHg(nora 0.5mcg/kg/min), FC: 111bpm, FR 32irpm, Sat 100% em VNI (Fio2 100%)

Após tudo organizado: materiais preparados, doses das medicações calculadas, e passagem dos planos, você realiza a Intubação por Sequência Rápida, com etomidato 0.3mg/kg, Rocuronio 1.5mg/kg, mantendo noradrenalina para garantir PAM > 65mmHg e hidratação com RL. A intubação é feita com sucesso na primeira tentativa em menos de 30s. A paciente é conectada a VM com parâmetros corrigidos para compensar a acidose metabólica. Iniciada a sedação continua com midazolan 0,20mg/kg/h e fentanil 3mcg/kg/h. Os sinais vitais se mantem estáveis durante e após a intubação. Você atualiza a família do quadro e encaminha a paciente para UTI. 

Leituras FOAMed:

R.E.B.E.L. EM – How to Intubate the Critically Ill Like a Boss

EMCrit 325 – The Hypoxemic Difficult Airway and Preox Discussion with Jarrod Mosier

Physiologically Difficult Intubations

Oxigenoterapia no Departamento de Emergência

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Cite esse texto como: Santos, Jule ROG, Casos em ME 002: Via Aérea Fisiologicamente Difícil – Caso 01, Blog Emergência Rules, disponível em https://emergenciarules.com/2023/04/09/casos-em-me-002-via-aerea-fisiologicamente-dificil-caso-01/, acessado em

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